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A ciência de conseguir um sim
por Você SA
Publicada em 18/12/2006
   

Por José Eduardo Costa

 

Quer você goste da idéia ou não, saber negociar bem é uma questão de sobrevivência. Você tem de negociar o tempo todo - da decisão de aumentar a família a uma promoção, passando pelo preço do carro que deseja ter na garagem. Só no trabalho, pelo menos cinco de dez ações diárias envolvem negociação com clientes, chefes ou colegas. O dado é de uma pesquisa feita no ano passado, com profissionais de diversos países, pela escola de negociação da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos.

   

 

Nunca se falou tanto sobre o assunto. Dezenas de livros abordam o tema e as melhores faculdades de administração e de Direito já incluíram a negociação nos programas de graduação, pós-graduação e MBA (mestrado em administração de negócios). Consultorias especializadas também estão chegando ao Brasil. É o caso da escocesa Scotwork, que há 28 anos treina executivos para negociar de forma eficiente em mais de 20 países. Em São Paulo há um ano, a Scotwork já formou 150 profissionais de corporações como Pepsico, Cisco, Microsoft e General Electric. Parece que a proposta atendeu à demanda do mercado, porque o número de clientes não pára de aumentar. Em 2004, a Scotwork fechou 14 turmas de 10 alunos. Para o ano que vem, já há 36 turmas na fila de espera.

 

Mas será que é possível formar um negociador dentro da sala de aula? Para o embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima, um dos maiores negociadores brasileiros, a resposta é 'não'. 'Não há curso melhor do que a prática. Foi assim que aprendi', diz ele. Durante 46 anos, Flecha de Lima, que hoje tem 71, defendeu os interesses do Brasil em negociações delicadas - como a que retirou dezenas de trabalhadores brasileiros do Iraque, em 1990, em plena Guerra do Golfo. Quando sentava à mesa de negociação era um gentleman, mas sempre foi firme em suas posições. 'Eu não acredito em negociação soft. Se você não for duro, acaba passando por ingênuo ou incompetente', afirma. O professor americano William Ury, por sua vez, acredita que é possível, sim, formar um negociador na escola. Diretor do programa de negociação de Harvard, Ury é tido como um dos maiores negociadores do mundo. É co-autor (com Roger Fisher e Bruce Patton) do best-seller Como Chegar ao Sim A Negociação de Acordos Sem Concessões (editora Imago). Hoje, além das aulas na universidade, Ury trabalha como consultor e tem entre seus clientes de chefes de Estado a presidentes de grandes empresas. 'Para mim, negociação é parte arte, parte ciência. Existem pessoas que nascem com um dom especial para solucionar conflitos. Outras têm mais dificuldade, mas podem aprender as técnicas e se aperfeiçoar', disse Ury a VOCÊ S/A. O que você vai ver nas próximas páginas é exatamente isso: dicas para ajudá-lo a se sair bem em qualquer tipo de negociação, seja na defesa de um contrato da sua empresa, seja provando a seu chefe que merece um aumento e mais tempo livre para seus projetos pessoais.

 

 

Sem confiança, nada feito

 

Em toda negociação há uma série de variáveis envolvidas. Sorte e o estilo de seu interlocutor são duas delas. Mas existe também uma parte que não muda e deve sempre ser levada em conta, não importa quem esteja do outro lado. Ganhar a confiança dessa pessoa é indispensável para que as coisas andem bem. 'Hoje as empresas e os executivos buscam parcerias de longo prazo num ambiente econômico que muda a todo instante. Sem um nível mínimo de confiança é impossível chegar a um acordo', diz Deepak Malhotra, economista e professor de Harvard. Recentemente, Malhotra escreveu um ensaio que aponta seis maneiras de estabelecer confiança em uma negociação. Elas parecem óbvias - e são -, mas muitas vezes são justamente esses cuidados que as pessoas esquecem quando estão tentando fazer um acordo.

 

1. Faça concessões - Saber abrir mão de um interesse em favor do outro pode ser uma das formas mais eficientes de estabelecer confiança. Antes de sentar-se à mesa, estabeleça notas para os pontos que irá negociar. Esse artifício dá uma boa idéia de quanto determinado item é importante para você e quais são aqueles de que pode abrir mão sem maiores prejuízos.

 

2. Crie um vínculo de dependência - Você precisa fazer seu interlocutor entender os benefícios únicos que ele terá se ficar do seu lado. Ou os prejuízos, no caso de não adotá-lo como parceiro.

 

3. Use sua reputação - Nas negociações, sua reputação sempre o precede. Por isso, introduza um parceiro externo que goze de prestígio perante a outra parte. Faça com que essa pessoa interceda a seu favor, ressaltando suas qualidades. O ideal é que ela faça isso antes, numa ligação telefônica ou em um encontro com seu interlocutor.

 

4. Seja transparente - No início, seu parceiro vai avaliar da pior forma possível suas intenções e interesses. Portanto, seja claro, objetivo e conciso. Antes da negociação, Flecha de Lima tinha o hábito de preparar seus argumentos e de, se necessário, desenhar a linha de raciocínio que iria seguir. 'Gaste tempo explorando, tentando esgotar todas as possibilidades. Durante uma reunião, nunca deixe a outra pessoa com dúvidas', diz.

 

5. Fale a língua do seu interlocutor - Esse princípio vai além de entender o idioma ou os termos técnicos do negócio que está sendo realizado. É preciso compreender a história, a cultura e a perspectiva da outra parte. É o que o professor William Ury chama de vestir os sapatos alheios.

 

6. Maximize os ganhos - O radicalismo na hora de negociar está ultrapassado. Na medida do possível, o acordo deve sempre ser feito na base do ganha-ganha. Afinal, você certamente terá oportunidade de negociar com aquela pessoa novamente.

 

Técnica é indispensável até mesmo para Ronaldinho, o jogador brasileiro que é um fenômeno com a bola. Com os negociadores não é diferente. Flecha de Lima aprimorou durante quase meio século seu talento de negociador. Você não precisa esperar tanto tempo. Há cursos que condensam toda a teoria em um ano de aula ou menos. Isso não quer dizer que você sairá de lá pronto para negociar milhões. É preciso praticar. No curso de Harvard, os alunos fazem simulações de situações reais, tudo para chegar na hora H com os argumentos na ponta da língua. 'Tornar-se um bom negociador requer paciência. Não se aprende da noite para o dia. A chave é a disciplina. Na prática, os mais calmos se saem melhor', diz o professor William Ury.

 

  

Calmo e eficiente

Os teóricos definem negociadores eficazes com base em três premissas: ter uma trajetória significativa de sucesso, ser considerado eficiente pelas partes envolvidas e contabilizar poucos fracassos na implementação dos acordos que fecha. O paulistano Guilherme Loureiro se destaca em todos esses quesitos. Começou na Unilever em 1988 como trainee administrativo. Galgou várias posições e hoje, aos 38 anos,

ocupa um cargo que costuma estar nas mãos de profissionais bem mais experientes: é o diretor mundial de fusões e aquisições da Unilever. Loureiro é responsável pelas parcerias e incorporações da gigante anglo-holandesa. Vive em Londres com a esposa e os três filhos. Em 2003, esteve envolvido em negociações que totalizaram 1 bilhão e meio de dólares. Com mestrado e doutorado em administração e finanças, teve noções de negociação na sala de aula. Mas é no dia-a-dia que ele faz a diferença. Está sempre ligado nas novidades do circuito financeiro. 'Converso muito com o pessoal do mercado e vivo marcando almoços de negócio. Se ficar trancado no escritório, perco informações importantes', diz. Quando está negociando costuma ser bastante comedido, pois é do tipo que prefere ouvir. 'Sou uma pessoa razoável, mas tenho uma personalidade forte e posso ser um osso duro de roer', afirma. O principal truque de Loureiro é conhecer seu interlocutor. Também diz que é importante deixar as emoções fora da mesa de negociação. 'Sempre que perco a calma me dou mal', finaliza.

 

  

Diplomata corporativo

Apesar do jeito tranqüilo e descontraído, o paulistano Paulo Macedo, de 33 anos, é do tipo que só senta à mesa de negociação depois de estudar bem o acordo e seu interlocutor. 'Informação para mim é poder. Quanto mais eu sei sobre a outra parte, maior a possibilidade de barganha', diz. Diretor de assuntos corporativos da cervejaria Kaiser,  ele é uma espécie de diplomata da empresa. Negocia com diretores, gerentes e a

presidência, mas seu principal público está em Brasília. É ali que ele tem de se desdobrar para conseguir os resultados que a empresa deseja. Desde benefícios fiscais até disputas com concorrentes são resolvidos nas negociações de que participa. Advogado formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, ele exerceu pouco tempo essa função. Bom de papo e bem relacionado, logo percebeu que podia usar suas qualidades em outra área. Foi fazer o curso de negociação em Harvard, nos Estados Unidos, e quando voltou abandonou de vez o Direito. Assumiu o cargo de gerente de relações institucionais na Coca-Cola. Trabalhava em Brasília. Foi então que pegou gosto pela arte de negociar. Há nove meses está na Kaiser, em São Paulo. Dono de um estilo conciliador, sua preocupação ao fechar um acordo é alinhar ao máximo os objetivos divergentes.

'Antes eu entrava numa reunião e só pensava em ganhar. Hoje minha preocupação é construir uma relação de longo prazo', diz.

 

  

Fera domada

A advogada paulistana Isabel Franco, de 48 anos, aprendeu a lição tanto na vida quanto na escola. Isabel é especialista numa área complicada do direito empresarial. Trabalha com contratos de licitação, privatização e quebras de sociedade. Formada em Direito pela Universidade de São Paulo, em 1979, começou há 25 anos no mesmo escritório  em que trabalha atualmente. Hoje é sócia sênior do Demarest & Almeida,

respeitado escritório do país, com 330 advogados. Durante muito tempo foi dona de um estilo firme e agressivo de negociar. Tanto que, certa vez, durante uma simulação de um acordo entre os alunos de Harvard, o professor Roger Fisher, co-autor com William Ury e Bruce Patton do clássico Como Chegar ao Sim (ed. Imago), lhe chamou a atenção. Fisher notou que, todas as vezes que Isabel estava prestes a bater o martelo, ela se levantava, inclinando-se na direção de seu interlocutor para reforçar seu interesse. Uma postura muito agressiva que podia ter dois efeitos: ou a pessoa, intimidada, fechava negócio, ou abandonava a mesa imediatamente, sentindo-se agredida. Nas duas situações, a advogada provavelmente ganharia um desafeto para o resto da vida. A Isabel de hoje é dona de um estilo mais amistoso. Ela até costuma brincar com seus interlocutores. Sim, esse também é um macete para ganhar a confiança da outra parte. 'Agora, sou mais flexível e busco conciliar os interesses dos envolvidos.'

 

  

Negociação no dia-a-dia

Há seis anos, o administrador paulistano José Roberto Siqueira, de 36 anos, deixou seu emprego em uma gigante do setor siderúrgico para se tornar funcionário do Banco Central, no Rio de Janeiro. No primeiro momento, não se deu conta de que teria de mudar sua forma de negociar no ambiente de trabalho. Na empresa em que trabalhava as negociações seguiam critérios objetivos e o reconhecimento vinha pelo resultado.

Mas, no serviço público, Siqueira percebeu que a história era outra. 'Além das negociações do dia-a-dia, há jogo político', diz. Por causa disso, decidiu inscrever-se no curso de formação de negociadores da Fundação Getulio Vargas, no Rio Janeiro. 'É um trabalho quase psicanalítico, mas também são gastas boas horas no aperfeiçoamento das técnicas.' No curso, Siqueira descobriu que é um negociador analítico, focado no planejamento e nas estratégias para definir o acordo. Ficou sabendo também que precisava melhorar sua comunicação e continuar acompanhando o processo mesmo depois que o negócio era fechado. Hoje, ele atua na área de negócios e sistemas de informação do Banco Central, num setor muito delicado da instituição: o Selic. Esse é o sistema que divulga para o mercado, entre outras coisas, a conhecida taxa Selic,que regula os juros. 'O curso me ajudou a enxergar meus pontos fracos. Agora, estou mais cuidadoso para lidar com as pessoas', diz.

 


Artigo fornecido pela revista VOCÊ S/A.
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