“Não sei se sou a favor de cotas, mas me convenci de que, em alguns momentos, se não forçar a barra, não vai”. Essa é a opinião de Fabio Barbosa, presidente do Itaú Social, sobre reservar cadeiras para mulheres nos cargos de chefia das empresas.

Durante um debate promovido pela ONG WILL (Woman in Lidership in Latin America) e o banco Goldman Sachs nesta semana, em São Paulo, o executivo contou que, no passado, teve de impor a presença feminina em uma das companhias que comandou.

Ele presidia o antigo Banco Real e os cargos de gerente de agência regional eram todos ocupados por homens, por puro preconceito.

Barbosa decidiu, então, que duas vagas deveriam ser preenchidas por funcionárias. Uma delas se deu bem, a outra acabou deixando o posto. Mas, o fato é que, quando ele saiu do Santander (que comprou o ABN AMRO, controlador do Real, em 2007), 12 dos 36 gerentes (ou um terço) eram mulheres.

“Fiz uma coisa que nunca tinha feito para quebrar o estigma”, afirmou.

Para Silvia Fazio, presidente da WILL, é só com mais mulheres no topo que será possível promover a diversidade de gênero nos outros níveis corporativos e obter equidade salarial e políticas de flexibilidade.

Ela lembrou que o problema de representatividade afeta os resultados das empresas e que várias pesquisas já mostraram que ter uma equipe heterogênea contribui para decisões mais bem elaboradas e até mais bem-sucedidas.

Uma pesquisa da McKinsey, por exemplo, revelou que corporações com pelo menos uma mulher na primeira linha de comando executivo conseguem gerar retornos para o acionista 44% maiores e lucros antes dos impostos 47% superiores que as demais.

Segundo Silvia, para haver diversidade efetiva, é preciso que as companhias sejam compostas de uma massa crítica de pelo menos 30% de mulheres.

“Mas isso ainda é uma utopia. O Fórum Econômico Mundial diz que a mulher só tem 28% das chances de um homem de atingir uma posição de liderança e que demoraria 117 anos para que uma paridade fosse alcançada. Nós não queremos esperar tudo isso”, afirmou durante o evento.

Regina Nunes, diretora administrativa e responsável pela operação da Standand & Poor’s na América do Sul, fez uma reflexão ainda mais profunda.

“Quem não pode esperar não somos nós, mulheres. Quem não pode esperar é o Brasil, que perde em produtividade porque desperdiça não só pontos de vistas diferentes, mas talentos”.

Regina disse que foi contra as cotas durante muito tempo, mas mudou de ideia ao perceber que, sem elas, as oportunidades não serão igualadas.

“Eu sei quanta pedra quebrei para chegar aonde estou e não acho justo que todas tenham que passar por isso. A presença da mulher tem que ser obrigatória, porque [a mudança] não vai acontecer de outro jeito. Já tentamos de todas as maneiras ‘bonitinhas’ e não deu certo”, disse.

Claudia Politanski, vice-presidente de jurídica e de recursos humanos do Itaú, concorda que é necessário estabelecer desafios para aumentar a participação feminina na liderança e desenvolver as profissionais, mas é contra reserva de vagas.

“Eu queria ser a favor de cotas, porque quando há uma obrigação legal, ela é cumprida. Mas vejo isso com ceticismo”, disse.

Ela contou que consolidou sua opinião quando líderes de países que determinaram prazos para que as empresas tenham uma parcela considerável de mulheres em seus conselhos (como Noruega, França, Espanha, Bélgica e Holanda) expuseram lados negativos da medida em um fórum.

“As mulheres que ocupam essas cotas muitas vezes não têm a mesma experiência executiva que os homens e são vistas como juniores. E, por serem retiradas de seus cargos para os conselhos cedo, acaba havendo menos mulheres CEOs e diretoras”, afirmou.

Na visão de Luciane Ribeiro, presidente do Santander Asset Management no Brasil, o que acontece é exatamente o oposto.

“Penso o contrário. Como existe um período de adaptação para o preenchimento das cotas, as empresas terão mais chance de se preocupar com seus talentos, porque elas serão as conselheiras do futuro”, contrapôs.

Meritocracia e preconceito

Luciane, que está há quase 11 anos na dianteira do Santander Asset Management, foi contratada por Fabio Barbosa.

O executivo destacou que o esforço para admitir mais mulheres não se trata de um benefício, mas sim de igualar oportunidades. “É óbvio que estamos falando de meritocracia”, disse.

Ele lembrou que, desde que a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) passou a fazer audições às cegas, na década de 1970, o número de mulheres entre seus concertistas cresceu “brutalmente”, prova de que a discriminação é algo real.

O preconceito é visível nos números. Um estudo da consultoria Korn Ferry Hay Group publicado em julho mostra que, no Brasil, mulheres ganham 1,6% menos do que homens que atuam em cargos exatamente iguais, dentro da mesma empresa.

Quando considerado profissionais do mesmo nível hierárquico, mas com funções diferentes, a disparidade sobe para 5%. No geral, o salário deles é 29,8% maior que o delas no país.

Os dados da Korn Ferry, também confirmam que a presença feminina diminui conforme a hierarquia aumenta.

Segundo o levantamento, enquanto nos primeiros níveis da pirâmide 61,5% são homens, no nível de “profissionais” a fatia sobe para 64% e, no de gerência, para 69,7%. Entre os executivos, 82% são do sexo masculino.

O panorama, porém, vem melhorando, de acordo com a consultoria. Em 2012, 85,7% dos líderes eram homens. Em 2008, eles chegavam a 91,3%.

Além do preconceito, a falta de apoio das empresas também afasta as mulheres da chefia.

“A mulher tem que atestar sua competência duplamente, enfrenta dificuldade quando volta ao mercado depois de ter filho… São tantos fatores que ela desiste, vai fazer algo mais leve, em que não precise se provar o tempo todo”, afirmou Luciane Ribeiro, do Santander Asset Management.

Para Regina Nunes, não é uma questão de desistir. “É que os passos que temos que dar são tão grandes, que sem estrutura, não dá. Eu, por exemplo, viajo três vezes por semana. Vivem me perguntando se meu marido não liga. Se fosse ele nessa situação, nunca ouviria isso”, afirmou.

Claudia Politanski, do Itaú, lembrou que as tarefas domésticas não são divididas de forma justa e que isso também prejudica a carreira feminina.

“Se a responsabilidade pela casa e pelos filhos ficar só não mão da mulher, [administrar vida pessoal e trabalho] é insustentável no longo prazo”, disse.

Nessa linha, Luciane Ribeiro, do Santander, defende que a licença-paternidade seja equilibrada com o período de afastamento das mães.

O caminho a ser seguido

Instituir metas ou cotas é um primeiro passo para alcançar a diversidade de gênero nas empresas. Mas, é necessário também incluir as mulheres e criar uma cultura.

Para isso, a liderança precisa estar engajada a favor do tema e criar oportunidades. “Do contrário, teremos o RH cumprindo números, mas essas pessoas não contribuirão para o resultado”, diz Flávia Gonçalves, gerente da Korn Ferry Hay Group.

Segundo a especialista, a integração passa por processos de coaching e mentoring e deve ser medida e cobrada por meio de indicadores.

“Essa história de que não tem mulher qualificada para ser líder não dá. O que falta é incentivo”, ponderou Regina Nunes, da S&P.

Fonte: Exame.com