Durante muito tempo no passado, as empresas foram reféns da crença de que seria possível aplicar fórmulas universais de produtividade para todos os funcionários. Não faltavam gurus cheios de “regras de ouro” para alavancar o desempenho de qualquer um.

Hoje, nenhum estudioso sério do assunto acredita na possibilidade de generalizar recomendações. “Não dá para enquadrar todo mundo em um mesmo modelo de comportamento”, explica Alexandre Teixeira, jornalista e autor do livro “Rotinas criativas: Um antimanual de gestão do tempo para a geração pós-workaholic” (Arquipélago Editorial, 2017).

Criado pela coach norte-americana Carson Tate, o conceito de estilo pessoal de produtividade traduz a ideia de que cada indivíduo tem um modus operandi — e é das suas características psíquicas e fisiológicas que precisam derivar os métodos de trabalho ideais para ele.

Tome como exemplo a ideia de que acordar cedo ajuda a ter um dia produtivo. “Todo mundo já ouviu a máxima ‘Deus ajuda quem cedo madruga’, mas ela se refere a uma realidade agrária”, explica Teixeira. “Para quem trabalha no campo, é importante começar o dia o quanto antes para aproveitar a luz natural, o que não faz sentido para a maioria das profissões urbanas”. 

Pular da cama antes do nascer do sol só é uma boa ideia para quem tem um relógio biológico ajustado a esse ritmo —o que não é o caso de 100% da população.

De forma geral, as pessoas se dividem em dois perfis quando o assunto é sono: os madrugadores, que gostam de dormir e acordar cedo, e os notívagos, que preferem começar e terminar o dia em horários mais avançados. Se você pertence ao segundo grupo, ajustar o despertador para as 5 horas da manhã será a receita certa para ter um dia arrastado, sonolento e improdutivo.

Alessandro Saade, fundador da iniciativa Empreendedores Compulsivos, está decididamente no primeiro grupo. Ele diz que pertence ao chamado “5 a.m. club”, o grupo de pessoas que naturalmente desperta muito cedo. “A manhã é produtiva para mim, mas não para todo mundo”, diz. “Não adianta nada acordar cedo se o seu organismo não estiver equilibrado para trabalhar”.

Os mal-entendidos sobre o tema vão muito além. Veja a seguir 4 hábitos diários que muita gente considera produtivos, mas não são:

1. Começar o dia respondendo e-mails

Você chega para trabalhar no escritório e a primeira coisa que faz é enviar mensagens? Aí está uma ótima forma de desperdiçar as melhores horas do seu cérebro. “O horário nobre do nosso organismo é quando acabamos de acordar”, explica Teixeira. Esse é o momento em que você está mais produtivo, mais apto a tarefas que exigem bastante do seu intelecto.

Para quê, então, gastar essa oportunidade com uma tarefa tão automática e reativa quanto responder e-mails? O ideal, de acordo com o autor de “Rotinas criativas”, é se dedicar a atividades que demandam criatividade, tais como redigir artigos, preparar apresentações ou organizar as ideias de um projeto.

Além de começar o expediente às voltas com e-mails, você também se esforça para zerar a sua caixa de entrada? Aí vai uma má notícia: além de impossível, esse hábito é um atentado contra o seu rendimento no trabalho. Teixeira afirma que um usuário médio recebe 147 e-mails por dia, dos quais 71 são irrelevantes. O tempo que gasta apagando mensagens inúteis soma 16 horas por ano — o equivalente a dois dias de trabalho inteiros só apertando o botão “deletar”.

Portanto, se você acredita que está sendo produtivo com a faxina diária do seu correio eletrônico, é melhor repensar os seus hábitos. Melhor usar esse tempo para outra tarefa, e aproveitar etiquetas e sinalizadores do seu servidor de e-mail para filtrar os destinatários que realmente merecem a sua atenção.

2. Caprichar na lista de tarefas

Outro hábito falsamente produtivo tem a ver com a produção de “to-do-lists” das principais tarefas que você precisa cumprir naquele dia. “Você acha que está se organizando, que está abrindo caminho para um dia produtivo, mas na verdade só está preenchendo uma lista”, diz Saade. “Se não tiver disciplina para cumprir o que está ali, não adiantará nada”.

Além de força de vontade para honrar as suas promessas a si mesmo, também é indispensável ter filtros para priorizar as principais tarefas que cabem no seu dia. O maior risco é virar refém de ciclos intermináveis: as atividades não concluídas hoje são transferidas para amanhã, e assim sucessivamente. O resultado são listas imensas, que só uma pessoa muito otimista realmente levaria a sério.

As famosas “to-do lists” não são ruins, em si, mas devem ser usadas com parcimônia e método. A dica de Saade é concentrar a sua agenda em no máximo três ferramentas, em vez de dispersá-la em apps do celular, serviços online ou papeizinhos perdidos na bolsa. Uma vez centralizadas, as suas tarefas devem ser organizadas por tipo e prazo, e você deve separar um número razoável de questões para resolver em a cada 24 horas.

3. Trabalhar ininterruptamente

Chegou a hora de executar o que você tem planejado para hoje? Cuidado para não acreditar no mito de que a melhor forma de terminar uma tarefa é se dedicar a ela obsessivamente. As pausas para respirar são fundamentais para restabelecer o equilíbrio do seu organismo e recuperar o foco.

“Nosso cérebro consegue se concentrar numa única tarefa, em média, por no máximo 90 minutos”, afirma Teixeira. “Depois desse limite, é melhor levantar, tomar um café, buscar uma distração, ou você acabará se cansando e se tornando muito improdutivo”.

Dividir o seu trabalho em blocos é uma técnica consagrada por especialistas em produtividade, mas obviamente deve ser aplicada com parcimônia. Se você entra no famoso “fluxo”, estado de consciência em que o trabalho flui de forma inconsciente, livre e prazerosa, não faz sentido forçar pausas desnecessárias. “Interrupções precisam ser feitas, desde que façam sentido para aquele momento do dia”, resume Saade.

4. Começar pelo mais fácil

Na ânsia de se sentir produtivo, você já começou a realizar pequenas tarefas enquanto evita suas entregas mais complexas? Já organizou papéis na sua mesa de trabalho em vez de fazer um longo e complexo relatório pedido pelo seu chefe?

Se a sua resposta é “sim”, vale ficar alerta. “Gostamos do imediatismo, porque resolver algo rapidamente elimina o estresse”, explica o psicólogo Piers Steel, professor da Universidade de Calgary, no Canadá. “Porém, quanto mais deixamos essas tarefas menores preencherem nossas vidas, mais difícil é manter o foco nos objetivos mais importantes”.

Um hábito similar e tão nocivo quanto priorizar “tarefinhas” é se perder no multitasking. “Se você tenta fazer várias coisas ao mesmo tempo não estará sendo mais produtivo; estará apenas fazendo tudo mais devagar, ou com menos qualidade”, explica Saade.

A chave de um trabalho produtivo não é resolver um grande número de tarefas (grandes ou pequenas) em pouco tempo. Na verdade, trata-se de selecionar as poucas atividades que merecem sua atenção — e não desistir até que estejam concluídas.

Fonte: EXAME.com