Deixar de trabalhar de forma intencional e sem justificativa é considerada falta grave e pode levar à demissão por justa causa; veja tira dúvidas sobre o assunto.
Mesmo com mais de 12 milhões de desempregados no país, muitos trabalhadores deixam de comparecer ao trabalho ou de realizar suas atividades sem justificar as ausências. É o chamado abandono de emprego que, segundo a legislação trabalhista, pode levar à demissão por justa causa do empregado.
Veja abaixo perguntas e respostas para entender como o abandono de emprego funciona, o que pode ser feito pelas empresas e o que o funcionário pode fazer para reverter a demissão. As respostas são das advogadas trabalhistas Cíntia Fernandes, sócia do Mauro Menezes & Advogados, e Lariane Del Vecchio, do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
O que é o abandono de emprego?
De acordo com Cíntia Fernandes, o abandono de emprego é uma ausência intencional e injustificada do empregado, que caracteriza falta grave, podendo levar à demissão por justa causa, segundo prevê a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Quantos dias são necessários de ausência para que haja o abandono de emprego?
Cíntia Fernandes e Lariane Del Vecchio afirmam que a legislação trabalhista não especifica o período exato necessário, mas a jurisprudência fixou em 30 dias consecutivos de faltas sem justificativa para a caracterização do abandono de emprego.
Segundo Lariane, a jurisprudência considera ainda período inferior aos 30 dias, desde que as circunstâncias comprovem a motivação para o abandono do emprego, como o funcionário estar exercendo atividades em outra empresa.
A empresa deve entrar em contato com o funcionário para saber o motivo das faltas?
Para Cíntia, antes de qualquer conduta da empresa, é importante manter contato com o empregado e, na impossibilidade, é necessário notificá-lo por meio de carta registrada com aviso de recebimento, com prazo estabelecido para se apresentar, sob pena de dispensa por justa causa em razão de abandono de emprego.
Lariane aponta que a empresa deve fazer a comunicação com o trabalhador e solicitar o retorno ao trabalho ou que justifique a ausência. A notificação pode ser feita também por carta protocolada diretamente com o funcionário, com comprovante de recebimento, ou através de cartório. “O importante é ter o comprovante de entrega para que a empresa tenha prova em caso de ação judicial”, diz.
O funcionário pode alegar doença, problemas pessoais ou morte na família, por exemplo, para não ser mandado embora?
De acordo com Cíntia Fernandes, o abandono de emprego exige dois requisitos: a ausência injustificada de 30 ou mais dias consecutivos e a intenção do empregado de abandonar o emprego. Caso não seja comprovada a intenção de não comparecer mais ao trabalho, o empregado não poderá ser dispensado por justa causa fundamentada em abandono de emprego.
“Diante disso, é necessário ter ciência sobre o real motivo das faltas e considerar as razões do empregado. Não significa dizer que essas faltas serão abonadas, tendo em vista que dependerá da motivação, mas se não houver a intenção de abandono, a justa causa não poderá ser aplicada por esse motivo”.
Lariane ressalta que, ao receber a comunicação do empregador, o funcionário deve se apresentar na empresa para justificar a sua ausência. Se for motivo relacionado à saúde ou caso tenha sido preso, por exemplo, deve apresentar atestado, declaração da entidade acolhedora e o que mais se fizer necessário para comprovar que não existe abandono de emprego.
O funcionário precisa comprovar o motivo das faltas para não ser demitido?
Para Cíntia, é importante que as faltas sejam justificadas pelo empregado para não caracterizar outras hipóteses de falta grave como o próprio abandono, desídia (negligência), indisciplina, insubordinação.
“A comprovação poderá ser por meio de atestado médico, caso o empregado não tenha tido a possibilidade de ter informado anteriormente, e documentos que comprovem outros problemas relacionados às faltas não intencionais”, diz.
Se as faltas forem devidamente justificadas, a empresa não pode fazer descontos do salário nem demiti-lo por justa causa.
O que a empresa pode fazer se for constatado o abandono de emprego?
De acordo com as advogadas, após as tentativas de contato com o empregado e do envio da notificação sem retorno, a empresa pode demitir o funcionário por justa causa.
Cíntia ressalta que os documentos da rescisão deverão ser encaminhados ao empregado mediante pagamento do saldo de salário, das férias vencidas mais 1/3 e 13º salário proporcional.
Lariane lembra que, ao demitir por justa causa, a empresa deve pagar o salário, descontado das faltas. E o funcionário perde o direito ao aviso prévio, ao saque do FGTS acrescido da multa de 40% e ao seguro-desemprego.
Quando cabe a demissão por justa causa?
Segundo Cíntia, a dispensa por justa causa é cabível quando o empregado comete falta grave, conforme hipóteses previstas no artigo 482 da CLT:
- ato de improbidade;
- incontinência de conduta ou mau procedimento;
- negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
- condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;
- desídia no desempenho das respectivas funções;
- embriaguez habitual ou em serviço;
- violação de segredo da empresa;
- ato de indisciplina ou de insubordinação;
- abandono de emprego;
- ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
- ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
- prática constante de jogos de azar;
- perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado;
- prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional.
Se o funcionário retornar ao trabalho, a empresa pode desistir de demiti-lo?
De acordo com as advogadas, a empresa pode manter o funcionário no emprego. “Nesse caso trata-se de faculdade da empresa. Uma vez caracterizado o abandono de emprego, o empregador está legitimado por lei a proceder a dispensa por justa causa. Contudo, não se trata de ato compulsório, a empresa poderá manter o empregado se assim preferir” diz Cíntia.
A empresa pode aplicar outras punições em vez de demissão, como desconto dos dias não trabalhados e advertência?
Segundo Cíntia, os dias não trabalhados sem justificativa poderão ser descontados do salário. Além disso, se as faltas estiverem relacionadas a alguma má conduta do empregado, o empregador poderá aplicar penalidades de advertência ou suspensão.
É possível o funcionário reverter a demissão por abandono de emprego? O que ele deve fazer?
Para Cíntia, é possível, desde que não esteja caracterizado o abandono.
“Nessa situação, caso não tenha uma resolução amistosa, é viável requerer judicialmente com fundamento na ausência de intenção de abandono de emprego. O ônus de prova nessa hipótese é da empresa de comprovar que houve a intenção do empregado”, diz.
Lariane afirma que o funcionário pode tentar via judicial reverter a sua demissão por abandono de emprego, mas ele precisa juntar provas de que não existiu a motivação de abandonar o emprego e que não recebeu nenhuma notificação da empresa.
Fonte: G1 Globo
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